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Três razões para pregar Eclesiastes

por Ezequias Amâncio|



Encerrei a série de mensagens em Eclesiastes aqui em nossa igreja.[1] Ao todo, foram cinco meses (abril e agosto) trabalhando nesse enigmático livro do Antigo Testamento. A temática que desenvolvi à luz da grande ideia do livro é a de que “somente no temor a Deus, a vida deixa de ser um enigma a ser decifrado, para ser uma experiência incrivelmente marcada por uma alegria no limite de nossas forças”.


Essa “grande ideia” eu adaptei de dois autores, Carlos Osvaldo[2] e Douglas Wilson[3]. De ambos, eu “pesquei” o conceito de que esse livro é um escrito de homem idoso, cansado de suas perambulações, e que se coloca para fazer uma avaliação criteriosa do seu entorno, em busca da chave que finalmente, iria lhe revelar o “sentido da vida”.


A despeito do que muitos podem pensar, esse é um livro conservador em sua fé. Nada de especulações filosóficas, o autor está preocupado com as questões da vida prática, das pessoas, e não apenas as vagueações de pensamentos sobre a humanidade. Quando me desafiei a expor esse livro, e comuniquei à nossa igreja, percebi nos olhares de muitos uma indagação: “o que vem por aí?”.


01. Eclesiastes precisa ser pregado por conta de sua preocupação com o enigma da vida.


É conhecida de todos os crentes e ímpios a expressão reinante no livro, “tudo é vaidade”. Posso afirmar que o eixo central do livro é a constatação de que tudo é “hebel” (hebraico) ou “vanitas” (tradução latina).



Na realidade esse termo não tem a ver com a ideia coloquial de algo que exprime orgulho ou soberba, mas ele se remete ao entendimento do que viria a ser “um sopro de ar”, “um vapor”, “um hálito”. A King James Atualizada fez questão de usar três sentidos para a mesma palavra:


Ec 1:2 “Que grande ilusão! Que grande inutilidade! Nada faz sentido!”, diz o sábio.

Gosto muito da ideia de Douglas Wilson para o conceito de “vaidade” como “repetitividade inescrutável”. Na realidade, Salomão expõe sua busca por algo que destranque a porta da sabedoria, a fim de fazer-nos entender de uma vez por todas, do porquê o mundo se constituir de uma repetição de fatos aparentemente aleatórios.


Mas, como eu já salientei, vale a pena estudar esse livro porque pode-se esperar ao fim dele uma chave que resolve de uma vez por todas esse dilema, fazendo com que o livro de Eclesiastes se transforme em um testemunho vivo de que a nossa vida se justifica quando é vivida sob o olhar de Deus.


Caminhei ao longo da Exposição, com o pensamento de Jason DeRouchie, compartilhado por Joe Rigney[4], que entende esse livro como uma longa reflexão sobre a vida “debaixo do sol” (1.3,9,14), uma vida num mundo divino, mas frustrante, partido, confuso. Tudo debaixo do sol é um enigma, um mistério insondável.


Ele defende ainda que “hevel”, o termo hebraico traduzido por “vaidade”, deva ser interpretado como “enigma”. Assim, ele quer dizer que “a vida debaixo do sol” é desconcertante, confusa ou incompreensível, embora ainda com significado e significância. Deste modo, ele rejeita a noção de que Eclesiastes defende que a vida é completamente sem valor, sem sentido e sem esperança. Ao contrário, ela está repleta de enigmas, bons e maus, e que nossa mente finita e caída e incapaz de compreender por completo como o mundo funciona.


02. Eclesiastes precisa ser pregado por conta de sua relação com os nossos dramas humanos.


É urgente compreender que a vida não é justa para ninguém. E o que eu pude deduzir de alguns retornos das minhas Exposições nestes meses vem corroborar o fato de que as pessoas “se viram” nas observações de Salomão. Todos se tornaram “Salomões” neste período. Vou destacar algumas dessas mensagens, de nossos membros[5] aqui:


Suas pregações no livro de Eclesiastes tem sido Bálsamo do Céu para a vida da igreja e para edificação dos santos. Tem sido mensagens confrontadoras e que apontam para Cristo, enfim, as mensagens em Eclesiastes tem nos levado para mais perto de Deus que está eternamente acima do Sol.


Já havia falado sobre a exposição de Eclesiastes, com alguém. A exposição foi tão incrível, tão bem-feita, bem explicada, tão profunda, que a partir de então não vou conseguir ler Eclesiastes da mesma maneira.


A linha de expor o livro , foi de certa forma diferente de alguns comentários que sempre tem um tom de mau humor outros de pessimismo e de alguns até que não seria um livro para estar na Bíblia, a não o último capítulo ... mas o que me chamou a atenção foi a abordagem do contexto " debaixo do sol" aonde estamos restrito ao tempo, espaço... e tudo isto é passageiro é um " correr atrás do vento " ou seja as oscilações da vida e sua brevidade , todo esforço seria inútil " nada faz sentido " e neste ponto que achei interessante sua abordagem... aonde a vida é assim mesmo, real, “nua e crua", não é mau humor ou pessimismo ... o que precisamos é encontrar sentido da vida no próprio criador da vida .


As pessoas se identificam com a proposta do livro, porque ele é desconcertantemente humano. E eu aceitei nas pesquisas para essa série a proposta de Douglas Wilson: “O grande filósofo hebreu que escreveu este livro, chamado Eclesiastes, convida-nos à alegria, mas à alegria pensante, que não retrocede diante de questões difíceis. Ele nos chama à meditação, mas à meditação que não leva ao desespero. E, como ele mostra repetidas vezes, fechando todas as vias de fuga, só os crentes podem desfrutar da vaidade que nos cerca por todos os lados”.


03. Eclesiastes precisa ser pregado porque ele aponta para a sabedoria de Deus, que para nós é plenificada em Jesus.


Para Derek Kidner[6], Deus se revela a nós neste livro sob três aspectos principais: como Criador, como Soberano e como a Sabedoria Inescrutável. Não que estes termos sejam exatamente assim aplicados a ele, com exceção do primeiro; mas podem servir como um conveniente ponto de convergência.


É impossível não ler esse livro sem suspirar por Cristo o tempo inteiro. Até o momento em que fazemos o link com o que Paulo vai destacar em sua carta aos colossenses:


Colossenses 2:2-4


2 - Para que os seus corações sejam consolados, e estejam unidos em amor, e enriquecidos da plenitude da inteligência, para conhecimento do mistério de Deus e Pai, e de Cristo,

3 - Em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência.

4 - E digo isto, para que ninguém vos engane com palavras persuasivas.


Quando chegamos nesse ponto fica fácil concordar com a razão de fé exposta por C. S. Lewis[7]: “Creio em Deus, assim como creio no sol, não somente porque o vejo, mas porque, vendo-o, vejo também com ele todas as outras coisas”. Logo, pregando esse livro, exporemos de modo vívido que a vida faz sentido em Deus. Somente nEle. Através dessa visão, tudo o mais passa a fazer sentido.


Por isso que, tudo finaliza com a fala de Michael A. Eaton[8], “quando Salomão examina a vida ‘debaixo do sol’, tudo parece fragmentado, e o rei não consegue divisar um padrão. Porém, ao considerar a vida do ponto de vista de Deus, tudo se junta de modo a constituir um todo. Se o homem deseja essa inteireza, deve começar com Deus”.


A chave para compreendermos esse livro, e expormos com poder “evangélico” (na melhor acepção desse termo) é confrontarmos os dramas oriundos da correria desta vida (que se assemelha, muitas vezes, como comer “algodão doce”, algo que não permanece) com a verdade de que, Jesus é o nosso maior tesouro, e ao temermos a Deus, iremos receber tudo o que Cristo é, de acordo com Paulo:


I Coríntios 1:30

30 - Mas vós sois dele, em Jesus Cristo, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção;

Em suma, a experiência de expor o livro de Eclesiastes abriu a minha visão de mundo. Me tornou ainda mais fiel à fé que conserva os valores afirmativos da autoridade das Escrituras sobre todos os assuntos relacionados à vida humana, e em sociedade. Para a vida da igreja, expor esse livro é desfraldar a bandeira do sentido em uma sociedade cada vez mais dividido entre o imediato concreto e o distante ilusório. Viva a vida, desde que ela esteja sendo vivida sob o olhar de Deus!

Ezequias Amâncio Marins


Pastor Titular da "Igreja Batista Central em Japuiba", Angra dos Reis, RJ.

Professor Mentor e Coordenador Estadual (RJ) do Ministério "Pregue a Palavra".

Graduado em Teologia e História (Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil e Universidade Estácio de Sá). Mestre em Divindade (Faculdade Teológica da Fé Reformada)


[1] Igreja Batista Central em Japuiba, Angra dos Reis, RJ.

[2] “Foco e Desenvolvimento do Antigo Testamento”, Editora Hagnos, 2006.

[3] “Alegria no limite as forças: A inescrutável sabedoria de Eclesiastes”, Editora Monergismo, 2015.

[4] “As coisas da terra: Estimar a Deus ao desfrutar de suas obras”, Editora Monergismo, 2017.

[5] Manterei seus nomes no anonimato.

[6] “A mensagem de Eclesiastes”, ABU Editora, 1999.

[7] “Cristianismo puro e simples”, Editora Martins Fontes, 2017

[8] “Eclesiastes e Cantares: Introdução e Comentário”, Editora Mundo Cristão e Vida Nova, 1989

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