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Origem social e formação Teológica no Brasil

Atualizado: 17 de jul. de 2019

por Nelson Galvão |




É de conhecimento de todos a importância de uma sólida formação teológica bíblica para o obreiro. Escrevendo a Timóteo, Paulo afirma que uma das qualificações para o pastorado é que este seja “apto para ensinar” (1 Tm 3.2; 2 Tm 2.24), que o obreiro saiba manejar bem a Palavra da Verdade” (2 Tm 2.15).


Entretanto, essa é uma realidade ainda muito distante no Brasil. A maioria dos obreiros não possui formação teológica bíblica. Por que? São inúmeros os fatores, mas um é preponderante e não pode ser evitado: a origem social.


Quem não conhece um seminarista com dificuldades para pagar a mensalidade do Seminário? Eu mesmo somente estudei em um Seminário interno porque tive o auxílio de meus pais para o sustento. Já vi inúmeros seminaristas abandonarem os estudos porque suas igrejas não podiam continuar a sustentá-los. Conheço outros tantos que têm que vender coxinhas para continuar os seus estudos. Todavia, o maior número ainda é daqueles que não conseguem sequer chegar nos bancos do Seminário.


De acordo com o relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) sobre América Latina e Caribe, de julho de 2010, o Brasil tem o terceiro pior índice de desigualdade no mundo. Na América Latina, o Brasil empata com Equador e só perde para Bolívia e Haiti em relação à pior distribuição de renda.


Essa desigualdade tem implicações na educação. A partir de indicadores como o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) e o SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), além de pesquisadores da área da educação como Cunha (1981) e Décio Saes (2008), é possível notar que, no Brasil, durante todo o percurso escolar, o aluno é submetido a uma série de seleções desiguais marcadas pela égide da sua origem social, fazendo com que o processo seletivo seja absolutamente desigual.


O sistema de educação no Brasil é perverso; é dual e a desigualdade educacional perpassa não somente a dualidade rede pública/privada, mas também rede pública/pública. Em outras palavras, no Brasil, tem acesso à melhor educação formal, seja na rede privada, ou na rede pública, quem tem origem social privilegiada; ou seja, sujeitos das classes média e alta.


Diante disso pergunta-se: esse triste quadro tem desdobramentos na formação teológica? A origem social dos obreiros influencia na sua formação teológica?


Parece-me que a resposta a esta pergunta é tristemente positiva. Vejamos algumas perguntas que nos fazem pensar a respeito: (1) Qual é a origem social dos seminaristas que estão nos principais centros de formação teológica no Brasil? (2) A origem social é fator de seletividade para os principais Seminários? (3) Qual é a origem social dos sujeitos que fazem parte dos principais congressos brasileiros de teologia? (4) Qual é a origem social dos pastores que ocupam os mais elevados cargos (executivos, grandes Igrejas) de suas denominações?


Obviamente para responder a essas perguntas seria necessária uma pesquisa mais acurada. Entretanto, não é difícil presumir que os “vocacionados” de origem social mais privilegiada, ou pertencem à igrejas com essas condições, são aqueles que têm acesso aos melhores centros de formação teológica, frequentam os melhores congressos brasileiros de teologia e ocupam os cargos mais altos de sua denominação.


Diante disso, iniciativas que contribuem para a quebra da perpetuação desse ciclo perverso na sociedade brasileira são muito bem vindas. Igrejas que se associam para o sustento de seus vocacionados, ou bolsas de estudo de instituições teológicas para vocacionados de baixa renda, etc.


No ano de 2011 conheci uma dessas iniciativas que mencionei acima, o Ministério Pregue a Palavra. Trata-se de um ministério da Primeira Igreja Batista de Atibaia, SP, que oferece um curso inteiramente gratuito, de excelência, para pastores e líderes, em pregação expositiva. Ele tem duração de 4 anos, com nível de pós-graduação, e funciona em regime modular. Alguns detalhes do curso merecem destaque: (1) É totalmente gratuito; (2) Funciona na região do aluno, sendo que são os professores que se deslocam; (3) O aluno recebe todo o material (apostilas e livros) gratuitamente; (4) A hospedagem e alimentação durante o curso também é gratuita.


Já são mais de 1100 pastores e líderes em todo o Brasil sendo atendidos por esse programa.


Desde que conheci esse ministério tenho me envolvido diretamente. Tempo atrás ministrei um módulo em Juazeiro, BA, sertão do Brasil. O grupo é constituído de pastores e líderes que estão trabalhando em localidade de difícil condição material de existência. Um deles trabalha em uma comunidade Quilombola, há 270 km de Juazeiro, BA. Esse homem afirmou o seguinte: “Sempre sonhei em participar de um curso dessa qualidade, mas obviamente nunca tive condições. Graças a Deus pela iniciativa de vocês”.


Também estive em Terezina, PI. O núcleo dessa cidade é um dos maiores, são 4 turmas, com 80 pastores e líderes ao todo. Um deles testemunhou: “Agradeço aos irmãos por ter vindo aqui nos abençoar. Eu já tinha algum contato com a pregação expositiva, mas nunca nessa profundidade. Sinto-me estimulado a, como no livro de Neemias, corrigir meus erros ministeriais”.


Diante disso, dou graças a Deus por iniciativas como essa que, diante da triste realidade da desigualdade social de países como o Brasil, oferece uma resposta positiva com o oferecimento gratuito de formação teológica bíblica para obreiros menos favorecidos economicamente; afinal, Deus não chama para o ministério somente aqueles que possuem uma origem social privilegiada.


Nelson Galvão


Nelson é casado com Simone desde 1997 e eles têm um filho.

Atua como diretor pedagógico do ministério Pregue a Palavra, como coordenador dos grupos do Pregue a Palavra de Cuba e Moçambique e como professor de História da Igreja, da Escola de Pastores PIBA.

Ele é formado em História e Teologia, pós-graduado em Administração Escolar e mestre em Educação (PUC-SP). Atualmente cursa o programa de mestrado em Teologia do Novo Testamento, no Seminário Bíblico Palavra da Vida- Atibaia, SP.


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